O que mais me revolta nessas campanhas eleitorais não é tanto o festival de baixarias e a troca de calúnias entre os pretensos candidatos. Cada um tem o direito de defender as idéias em que acredita e de lutar por aquilo que considera ser o certo e o melhor, desde que com suas atitudes não fira a liberdade de outros.
Mas o fato é que as campanhas, ao menos na história do Brasil, sempre foram assim; os candidatos não se importam de verdade em divulgar suas idéias, antes disso, divulgam apenas informações convenientes que beneficiam suas próprias campanhas. Não são apenas as falhas do adversário que eles expõem. Melhor dizendo, na maior parte das vezes nem ao menos são as falhas dos adversários o que eles expõem; são apenas informações manipuladas, que contêm alguns poucos fragmentos dos fatos, com o claro objetivo de usar a opinião pública a seu favor.
Essa campanha presidencial, por exemplo, tem sido enojante. Talvez seja porque estou cansado dessa mesma ladainha de quatro em quatro anos, não sei. Mas o que parece é que as coisas nunca vão mudar. A questão do petróleo, do pré-sal e da Petrobrás é um exemplo claro do que estou dizendo. Os candidatos, ambos, usam a questão do petróleo, em termos de concessão de exploração à empresas estrangeiras e privatizações, como bem entendem; nenhum deles apresenta documentos, fatos! Eles apenas jogam informações, trocam acusações e nós, massa de manobra, que escolhamos em quem vamos acreditar, certamente baseados no critério sofista de optar por aquele que argumentou melhor.
Hoje (26/10), vi a campanha do candidato tucano, José Serra, afirmar no seu horário obrigatório que a Dilma, vejam bem, a própria Dilma em pessoa, vendeu o petróleo brasileiro à empresas privadas, tanto nacionais quanto estrangeiras. A Dilma, por sua vez, defendeu-se dizendo que essas vendas e privatizações foram contratualmente pactuadas durante o governo anterior, do tucano Fernando Henrique Cardoso, e que a riqueza maior descoberta em seu governo fora o pré-sal, cujas regras de exploração foram modificadas para que não acontecesse com o pré-sal a mesma coisa que aconteceu com as outras reservas de petróleo nacionais.
Tudo isso passou em imagens editadas do debate de ontem (25/10), na rede Record. Nenhum deles apresentou provas ou documentos de coisa alguma, a não ser imagens aleatórias que não provam absolutamente nada. Como eu disse, cabe a mim e a você, eleitor, escolher em quem acreditar. E eu não consigo aceitar que o povo deste país se conforme com esse absurdo.
São informações loucas, com nenhum embasamento de realidade, que eles simplesmente jogam para o eleitorado. Alguém é capaz de me dizer como se pode confiar em alguém que não diz a verdade toda?
Eles visivelmente se aproveitam da ignorância do povo brasileiro e de seu absoluto desconhecimento da Constituição Federal quando fazem esse tipo de coisa. E quando eu falo “eles”, não me refiro apenas aos candidatos, que, por incrível que pareça, são as peças menos importantes nesse quebra-cabeças; me refiro principalmente à toda a máquina partidária, que é de longe a maior beneficiária nessa história toda. Quando divulgam boatos estúpidos e quando incentivam a manutenção de idéias erradas por parte da população acerca da máquina do Estado, eles alimentam o jogo sujo que se arrasta há anos na história política do Brasil.
A maior parte do povo brasileiro não sabe, por exemplo, qual é a atribuição de um deputado e de um senador; ou ainda de que maneira estão organizados os três poderes e como isso influência a estrutura do governo.
O presidente da República, enquanto representante do Estado Nacional e líder do executivo, organiza o plano orçamentário, ou seja, redireciona verbas para investir na manutenção da máquina estatal, motivo pelo qual o governo federal é tão preocupado com a arrecadação tributária; e o presidente não faz isso sozinho, mas com a ajuda de seus ministros, secretários, assessores e etc. Além disso, nenhuma decisão que o presidente da República venha a tomar tem valor se não for, antes, aprovada pelas duas casas no Congresso Nacional, a Câmara dos Deputados (cujos membros representam as cidades brasileiras) e o Senado Federal (cujos membros representam os estados brasileiros).
Ao Congresso Nacional, com suas duas casas, cabe também a função de legislar. Isso quer dizer que o Presidente da República, por melhor e mais bem intencionado que seja, não faz as regras do jogo; ele apenas joga com as regras que apresentam a ele. É o Congresso que faz as leis e algumas desses leis, chamadas de cláusulas constitucionais pétreas, não podem ser mudadas nem mesmo pelo Congresso, a menos que seja feita uma nova Constituição e isso também seria feito pelos representantes do poder Legislativo.
É por essa razão que muitas das promessas de campanha não são cumpridas. O plano orçamentário precisa ser aprovado pelo Congresso e algumas vezes, em política, as idéias divergem. É por essa razão que a busca dos partidos pelo poder é tão acirrada.
Assim, a Dilma, sozinha, mesmo que ela fosse o presidente, coisa que ela não era, jamais poderia ter vendido o petróleo brasileiro a quem quer que fosse. Ela até poderia ter sugerido ou elaborado uma proposta, mas essa proposta não teria o menor valor caso não fosse antes aprovada no Congresso Nacional, onde, diga-se de passagem, há representantes de praticamente todos os partidos em maior ou menor grau.
São essas coisas que ninguém diz ao povo. São essas coisas que o povo não sabe e justamente por não saber não consegue fazer a democracia funcionar.
Talvez no dia em que eu ver um candidato dizendo toda a verdade, se preocupando em esclarecer a quem não sabe e não conhece as regras do jogo e embasando seus argumentos com provas documentais, ainda que factuais, eu possa acreditar nele e confiar no que ele diz. Até lá, Dilma ou Serra, tanto faz.